sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

um tempo, um intento

Não desejo um feliz ano novo,
posso desejar apenas você feliz,
e felicidade é um treco muito diverso, singular e até esquisito às vezes.
Pois um ano é apenas um intervalo de tempo, uma convenção,
e que ainda virá.

Desejo tantas realizações ou não realizações,
porém desejo mesmo mais tempo com o que queira fazer.
Que seja inútil.
Que seja nada.

Que perca tempo ouvindo músicas repetidas que mais gosta.
Músicas bregas, músicas de amor e de dor de cotovelo.

Que possa dormir quantas vezes quiser até o sono acabar.
Que sofra de insônia se necessário.
Que durma pouco se bem acompanhado,
e quando sentir sono no dia seguinte,
que sofra de lembrança.

Que ande na chuva,
que perceba o quanto as plantas cresceram,
que experimente novos grãos,
que veja mais detalhes de sua paisagem.

Que ouça histórias da sua tia anciã,
regado de bolo de fubá quente e café.
Que gaste tempo jogando pedrinha no lago,
que encha bexiga com as crianças,
e que ganhe uma gargalhada na grama.

Que possa sentir-se só no sofá,
olhando o vento chacoalhar árvores pela janela.

Que possa rir,
sempre que o guarda-chuva quebrar.

Que compre muito menos,
pois coisas são só coisas,
e o mundo já não pode suportar tanto lixo e inutilidades de coisa.
Que ganhe uma mala de roupas lindas,
da sua prima que engordou ou emagreceu.

E que se decepcione,
mas somente o quanto puder amar.

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

papo noel

enfornado no cetim roto
envolvido no meio do povo
papai noel, vestido de coca cola
não estava de sunga
mas tocava zabumba

e o pernil assando a 200 no forno
e eu deseformando a 300

hemisfério sul, véi, sul, véi!
verão e poco dinheiro no bolso

o banco faz "neve" cair
never, véi, never, véi!

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

dois mil novecentos e bolinha

posso misturar meus discos nos seus?
prometo deixar caetano encoxando a nana
você bagunçando minha coleção do chico
preparado para o álbum branco dos beatles?

o disquinho rodando devagar...
a gente mostra o vinil aos nossos netinhos
afinal um dia a gente fica velhinho
tocando o bolachão com chiadinho.

sábado, 9 de julho de 2011

não sei recitar
não sei decorar
texto pronto
por isso aprisiono
as palavras aqui
nesse papel
pra quem sabe
poder dizer
que fui eu quem disse
mesmo que eu
desdiga tudo que visse
bah, que babaquice!

sexta-feira, 8 de julho de 2011

roma ao contrário

o amor é uma ameaça
o amor é uma amarra
o amor que venceu
o amor que me roeu
o amor que me roubou
o amor que me doeu
o amor fez algazarra
o amor que nunca amara
o amor que amei de mim
o amor amor demais
o amor desparafusou
o amor de carne viva
o amor pegou de jeito
o amor da minha vida
o amor que põe viva
o amor dependente
o amor inconseqüente
o amor come minha boca
o amor me arranca os dentes
o amor esse sou eu
o amor, que sou eu?

poema ausente

ainda não sabes
mas emprestou seus olhos
para eu ver o mundo 
em verdes óleos
assim ao ver-te 
escorrer nas árvores
vestir as vitrines
dirigir meus transportes
homenageio você em mim
encurto o tempo
trago o espaço dos corpos 
(que nos separam)
para dentro de mim

ainda não sabes
onde moro em você
nas esquinas dos corações
onde espreito tuas batidas
respiro teu ritmo da noite
te embrulho hoje a lua
presenteio em homenagem
da falta que sinto
do cheiro da tua vaidade

ainda não sabes
aí de longe
que aqui está
que não sai de mim
não vai

ainda não sei
o tamanho desse negócio
uma ponte infinita
sem começo nem fim
fincada nessas margens -
você
mim

segunda-feira, 6 de junho de 2011

treco

ouço ecos

corações ocos
feito ovos
depois
de omeletada

ecoam
destoam

em manada

peleosso
e mais nada

sexta-feira, 3 de junho de 2011

segunda-feira, 23 de maio de 2011

mulher de mim

sobre ser livre
sobre ser sexuada
sobre ter força
sobre transformar a melancolia em poesia
sobre temer
sobre não agüentar
sobre enlouquecer de tanto amar
sobre falar confuso, mas falar
sobre ter coisa na mente
sobre não mentir o que sente

muito bom, melhor mesmo,
melhor que seja na mulher dos outros.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

psico análise

eu colocaria uma boca
no meu inconsciente
instalaria uma corda vocal
e um microfone bem na frente
com ecos no meu coração

para entender de qual substância
é feita meu avesso subterrâneo
minhas sombras subcutâneas
que se recusam a aparecer à luz
mas que mastigam e mascaram
meus porquês, meu vir-a-ser

eu, abandonada à própria sorte
ou ao próprio azar
de nem saber por onde começar
ou ao qual freud perguntar

domingo, 15 de maio de 2011

centro cirúrgico

se suas mãos pudessem
acarinhar meus nervos
por debaixo da pele
por entre o músculo

se mãos apertassem
os átrios do coração
pulsasse sangue
aplacasse coágulos
para grudar a veia
circular o plasma

se mãos amaciassem
o revestimento de alma
da tez da pele
para unificar vísceras
sobre joelhos e pernas

se mãos fincassem
todos os ossos
tanta cartilagem
faria o ombro
suportar o peso
do corpo
todo

e talvez
se morresse
pouco

vive em mim

tem uma poesia zanzando em mim
passeou pela barriga
tênia
solitária

tem uma poesia me transitando
sobe e desce na garganta
perde
dedos
teclas

tem uma poesia comendo em mim
traça aos poucos as cinzas
massas
cerebelos
cabelos

tem uma poesia me bagunçando
cegando os óculos da cara
analfabeta
letrada
canetada

não me permite ler
não me permite escrever
não me permite ser
sem dela saber
o que tem para dizer

tem uma poeta que manda no mim

segunda-feira, 9 de maio de 2011

se quiser beijar apareça
se quiser deitar anoiteça
se quiser entrar aporteça
se quiser hoje vem terça
se quiser por si veja,
mas seja

terça-feira, 3 de maio de 2011

coisas pequeninas
olhadas por uma formiga

odores, calores e Dolores
fazem com que as dores
transformem as flores

um dia-a-dia microscópico
invisível a olho ótico

abre no chão a fenda
enxerga-se o centro da terra

Osama ou Obama
não muda o peso da folha
sobre as costas
sobre um formigo inverno
ou sobre um calor do inferno

terça-feira, 26 de abril de 2011

às dezoito horas
te encontro lá embaixo
do pé de carambola
no topo do barranco
onde fica o pomar
de frutas que despencam
cítricas maduras e cegas

as frutas guardam doces
segredos e insetos
pois todos os beijos
ao longo dos tempos
sobre as folhas secas
perfazem amores
compotas e queijos

manhã

sabe aquela camisola antiga amarela?
sabe quando acordas com brilho nos olhos e remela?
sabe o cabelo remexido?
sabe o cheiro de cama amanhecida?
sabe os pés no chão ensolarado?
sabe um risinho sonado?

sem as máscaras maquiadas
sem esconder lindas feiúras
sem abafar desesperos d’alma
sem acanhar as dúvidas

sem meias
sem meias verdades
sem vestidos inteiros
sem amor trapaceiro

meu coração tão cheio
repousa quente nesse travesseiro

sexta-feira, 22 de abril de 2011

posso morrer
por amar demais
ou por não amar

posso viver
sem entender
sobre o nascer
sobre o viver

soterrada
sob um mar
de amar

segunda-feira, 11 de abril de 2011

quarta-feira, 23 de março de 2011

menina de mim

senti-me dona de mim
quando andei no teleférico

a cadeira sozinha
de uma pessoa só
flutuando no ar
silêncios de árvore
nas alturas de minha criancice

fiz juz à confiança
de que cuidava de mim
de que podia ser só
a paz e o silêncio de só ser
ser para ver vento soprar
sentir o mundo ir e voltar
os pensamentos do cabelo voar

dia dos hómi

cê me bagunça os cabelo
chacoaia as idéia
penso tudo novo
querendo as coisa véia
de hómi e muié
que nem minha mãe queria
e eu nem sabia
que de tudo eu fazia
pra te ter todos os dias
dançando na minha cozinha
sambando na pontinha
alegrando as piadinhas
nas minhas zoreias
tomadas de seu riso
de menino liso
que no fim do dia
abre a porteira
cheira à hómi
e me pega descalço
e me mostra um altar
me põe devota
de ti
de mim
de nós
para que durem
os nossos nós
e assim se torçam
as cordas
em nós

terça-feira, 22 de março de 2011

gravura de si mesma
grava por si
inscrições rupestres
num papel terrestre
pra ver de longe sua alma
de perto sua aura

quarta-feira, 9 de março de 2011

dia das muié

preciso de vc para abrir meu vidro de palmito
não porque eu não saiba ou não tenha muque
mas porque é vc que eu quero na vida da cozinha minha

culpe a desculpa

desculpe por agradar eu tentar
desculpe por menos eu ser
desculpe por falar não saber
desculpe por demais falar
desculpe da angústia tomar
desculpe a lágrima lograr
desculpe por não silenciar
desculpe pela alma procurar
e assim esquecer
dos corpos encontrar

desculpe o tempo perder
desculpe o desculpar

Manoel de barro

os rios de ontem –
por não se suportarem
mais marginais –
se subiram sobre as pontes
se sujaram de limpeza

tomaram a memória da cidade
para que ela se lembre árvore
e os meninos musgos

para que se pesquem paralelepípedos
nos alagamentos

para que se entremeiem oxigênio
nas correntes
se é que ainda sobram
nesses sapos narizes!

sexta-feira, 4 de março de 2011

sua doçura me desarma
seu olhar me comove
sua voz me escorre
sua palavra desaloja

um sentimetalismo brutal
invade meu espírito,
coloca a vida em fôrmas
de sonetos líricos

quarta-feira, 2 de março de 2011

paz burguesa

há regularidades
de sala de jantar
de noivos a esperar

há cotidianidades
de cafés da manhã
de roupas passadas
surpresas futuras
espontaneidades,
embora roubadas

mas há a segurança
de se saber
como e qual vinho tomar
e sobre qual filho acarinhar

terça-feira, 1 de março de 2011

adorme-o-ser

Adormecer em seus braços
é desnozar os laços
dos meus vãos esgarçados
é preencher os espaços
de um mundo escasso

descartar os bagaços
para nascer fruto
e escorrer suco
pelos fundos sulcos
em minha alma cavados

são pés
são dedos
agora calçados

domingo, 20 de fevereiro de 2011

por wilson tonon

MINHAS      PELADAS
            
                            PALAVRAS
                  
                                       PENSADAS


PESANDO    NO

                                             NADA

LEVANDO A

                SEM TER

                          SENTIR

                                          SENTEAMO
meu escritório é na rua
o meio-fio onde sento
a mesa é calçada

trabalho de
observar passantes

meus clientes
em pé
nas filas dos cafés
comendo seus filés

amigos de metro
em silêncio
olham as janelas negras
sem paisagem

conversas de banco
rasteiras
barulham
o calor de fevereiro

carros engarrafados
desesperam
os que esperam
sob meu olhar

trocam os clientes
da noite e do dia
pelos cinemas
pelas igrejas

fingem encontros

eventual -
a poesia de um olhar
uma flor desabrochar
um beijo adolescente
um riso incoerente

se remunera
um trabalho
uma alma
se desonera

muso

um mapa perdido
nas terras achadas
do teu corpo

bússolam mapas
das tuas barbas
e me põem
nos caminhos 
dos teus pelos

tateio seus toques
pelos escuros das noites,
onde encontro
o norte,
um leme,
um leste

um farol lunar
hei de seguir

pois farejei um cheiro
da luz de um corpo inteiro

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

di-mensão

o amor
multiplica
cada cm seu
pelas @s
armazenadas
nos ha*
infinitos
de nossos territórios
íntimos

* hectares de afeto

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

roupa íntima ou azul calcinha

as calcinhas, tão monossilábicas, tão dependuradas
num varal móvel de um apartamento imóvel
andavam queixando-se de certa monotonia e solidão,
porque não?

era de se ouvir, baixinhos
seus lamúrios de uma sílaba só

até que cuecas - bem cuecudas,
faceiras de ventos dos pregadores,
deixaram-nas serelepes e políssonas
de tanto que sassaricam em seus ouvidos 
e permitem que roupeiem, enfim, em ombros íntimos                                                                                                

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Armarinho

de quantos fios
se tece uma mulher?
são tantos os filhos
os risos
e as falhas

as dores
embaixo das anáguas
as tranças
por cima do cheiro de flores

um vestido enviezado
labuta alegre
todo dia

uma força
borda as mangas
do algodão
dos teus braços

enquanto a cada minuto
mais uma maria
vem ao mundo
para embelezá-lo
de passamanarias

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

MEUS PÉS LÍRICOS

CAMINHAM SOBRE A PONTE 

DO MEU RIO ONÍRICO.
Você marca o território, mas não ocupa.
Saiba que as terras do latifúndio que me pertence
são férteis demais para desperdiçar.
Terra roxa, de sobrar fruto.
Lá não tem monocultura que a deserte.
Talvez não aguentes semear, regar, esperar as colheitas,
suportar as intempéries e entresafras.
Então ao menos respeite minha topografia.

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

palavrão

tuas palavras
escritas
faladas

releio
reouço
sem fim
dentro de mim

um terreiro eterno
de cânticos
conhecidos

um mantra
hipnótico

organiza
um estar-no-mundo
no barulho
desse silêncio

agricultores celestiais

a felicidade me pegou no colo
me jogou num barco contigo

numa cantiga de maré
cantamos até o paraíso

nadadores, banhistas, amantes, passantes
encharcaram nossas águas vagas
sem nenhuma pressa de amanhecer
pois uma cobertura de estrelas
tivemos de plantar noites inteiras

depois da colheita o corpo exalou
uma luz verde exausta
porém quente
e eterna
e terna

sábado, 22 de janeiro de 2011

casa

cada vez mais longe
cada vez menos coisa consigo carregas
coisas minhas, coisas atadas em nós

cada coisa que vai
perde-se em meio a outras -
novas e velhas coisas

cada coisa que fica
fica como saudade de coisa
coisa tua
de tu,
sua coisa!

sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

para quem 
a gente conta o medo? 
ele tem contagem?
uma ponte sem margens
flutua sobre um mar 
que cobre um mundo circular

engendra-se assim 
a ponte sem começo nem fim

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

fonte da juventude

já sei,
me sinto
com você
uma velhinha
daqui trinta anos

não precisamos falar
nem belezar
só queremos ladar
e olhar

(beleza junto é mais mais belo que beleza só)

Guichê

- paga-se pelo excesso de bagagem -

são sacolas
bolsas
mochilas
naftalinas

afundam
o cume dos ombros
comem
o couro das costas

penduram
pertences
fuligens

necessárias
se para o ano que vem
transportadas?

pesam os destinos
nos assentos dos corações marcados
de um aeroporto interditado
por um dilúvio do pó dos séculos
acumulados no ano último

(isso é o que dá
ler Bandeira
no banco de espera
do fim do ano
de uma prateleira)

vestimenta

tu és um soneto clássico
dentro de um terno roto

rimas alinhadas,
mas golas roídas,
os ritmos perfeitos,
e as solas furadas
(gastas pelas lutas
palavradas)

Vou vestir mais leve
tuas palavras poídas.
Vou livrar a forca
de tuas gravatas
até deixar-te nu,
sem palavras

para só assim
te afagar
no pouso dos ombros
nas caligrafias dos lábios -
esses sim
já calados e pelados,
assim tão esperados.

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

não quero nenhuma brincadeira
sobre meu jeito de falar ou de ser
nenhum comentário
sobre minhas saias ou meus cabelos.
é tão difícil de entender
que só posso ser inteira
mesmo sendo no seu ônibus
só mais uma passageira?
Nas dobras do tempo
e sobras de relógio - 

folhei uns sebos
colhi uns pães
cantei uns pássaros
medi uns matos
pensei uns amigos

Distraí de mim,
enquanto um rio vital 
me transpassou

um rio que conhece 
delicadeza de margem
e paz de paisagem.

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

poema primário

não prometo que aguento a tua espera
mas prometo dedicação a tua presença

não prometo ser sua em toda tua ausência
mas prometo toda entrega em tua presença

fique o tempo que precisar do lado de lá
só não sei como passam as vidas do lado de cá

vá e aproveite o primor de minha generosidade
só não espere que aqui se dura uma eternidade

não me onere com pedidos
e continue sem promessas.
as desculpas são só suas
sobre sua falta de pressa.

só não sei o quanto dura a água da minha tigela
sei que o amor é uma fonte do tipo que um dia seca.