segunda-feira, 29 de setembro de 2008

noite morta-dela

o abraço que faço
tem gosto de moça de fino trato
anda e tira o laço

a fita amarela
logo vi na janela
enquanto garçon beijava a boca dela

berço fogoso
coloca o moço
quando penso, embaraçoso

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Proletariando

engoli proletário. por indigestão regorgitei empresário
que por infortúnio paga meu salário
diz que tem família, mas foste um belo salafrário

vivo pensando quem disse que o mundo deve ser assim
nasci e acreditei o que enfiaram pra mim
que nobre é o idiota que trabalha sem fim

o salário mal dá pra coisa toda do mês
diversão quase não tem vez
a mulher e mamãe não entendem minha insensatez
já compraram a idéia da novela que pra ser feliz nasça burguês
o seu joaquim do boteco não faz fiado nem pro freguês

estou disposto a não mais agüentar a sofreguidão
não pode ser que Deus me pôs na vida pra esse papelão
de aguentar os caprichos do patrão
e ainda assinar a carta de demissão olhando pra cara daquele bundão
'xá comigo que vamos descolar logo o tostão

quero ter a vida descomprometida de coisa sem valor
porque não ter mais dignidade no labor?
quem foi que disse que tenho que aguentar tanta dor
agora a palhaçada tem até nome: colaborador, colabora com a dor

assino logo essa carta, que pra mim é de alforria
vou então fazer meu dia
sem medo da correria
quem sabe até com a euforia
de também ser patrão um dia

num é que Marx tava certo
a prole proletária quer mesmo virar algoz
será que quando a luta de classes acabar o mundo vai ter fim?

lunar

delato meu egoísmo
desalimento meu vil heroísmo
espelhado nas ridículas partículas
do tempo dos meus dias
meus atos, com prefácio e glossário
descompreendem e incompletam o buraco que se torna toca de esconder

entro dentro, o avesso pra dentro
extermino ou enlouqueço
fervilho ou ofereço
o ego-ísmo lírico do precipício

domingo, 21 de setembro de 2008

Quadras de quatro

Teu convite ao exagero
Foste a peste da minha trama
Mas me tirou do desespero
Resgatou-me do meu interno drama

Quando me olhei no espelho
Colocado por outro na minha frente
Percebi que não preparei o enterro
Do que é preciso tirar da minha doente mente

Jogada ao abismo do abuso
Frequentemente envaidecida
Entregue a qualquer tipo de uso
Muito da desenxabida da vida

Sem esboçar compreensão
Faço esforço de pensar
Tomada de sedução
Dando ao outro a minha decisão

domingo, 14 de setembro de 2008

A estética da língua

A compreensão do motivo pelo qual o chocolate causa tanto prazer em nossas bocas......talvez seja porque é uma gordura doce que se dissolve com o calor da língua em atrito com o céu da boca, que fica estrelado. É uma doçura marrom com um gosto particular único e forte que por produção da cultura apazigua o coração. Pode ter crocantinhos barulhentos, amêndoas que trazem a dureza repentina ou a fruta que soma o azedinho perfeito. Minha gata não come comida que não seja a dela, mas um dia a peguei abocanhando um presunto que estava sobre a mesa com a gula de quem sabe o que é bom. O chocolate nos supera da solidão bicho e nos iguala na busca da repetição do prazer, que nos move no tempo. Derrete, adoça e escurece a boca de desejo. Acho que comi a caixa toda.

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

é a dor que dói em mim

Para a dor da alma não há prozac
Para a dor de cotovelo não há aspirina
Para dor de gulliver talvez haja birita
Para a dor do peito não há floral
Para a dor do pé não há samba
Pára a dor, por favor!

A dor que dói

Mal-estar súbito
Não tão súbito pois muito claro está o porquê
É nó que desata, mas arranca sem dó
Nó tem dois lados, como nós

Uma coisa se aparta da outra
A rede entra em colapso
Uma mexida de um lado abala a rede
Que se fragiliza no que segura

Sentir-se um descarte
É como se nada mais aflorasse
Nada mais há que alguém e si próprio se interessasse

O presente fica diluído no passado
O sem futuro chega grande e pesado
A vontade de saber impede a morte como simulacro

rai cai

aprendendo hai kai
sobre rimas, versos e estações
escolho a folha que cai

chegou ao Brasil a tradição
ensinaram a beleza
palavra curta do Japão

sábado, 6 de setembro de 2008

sem título, tinta óleo

tenho preguiça, com sono e bunda
estoy só, vazio e ocupado
faço palavra, voz e desço música
canto azul, coisas e caos
soy hombre, maricas e fubá
lambo lerdo, incerto e profundo
durmo fanho, roto e lado estranho
escrevo tacanha, de verdade sem tamanho
aprendo como e quando verbo, substantivo ou adjetivo

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

hot dog cat

Cachorro vira lata
toma água turva da sargeta

Gato escaldado
ganha a oitava vida depois de rasgar o lixo

Dorme embaixo do carro
em cima do telhado

Ofereci comida de primeira
um rejeitou outro não quis

Porque a água suja e comida fula
tem o preço da liberdade sem coleira

Cachorro sempre quer um chamego passageiro
gato um olhar sorrateiro

Aproveita, tira uma casquinha, e vai embora,
ligeiro

Declaração de alguma coisa

Bateu em minha porta, abri, jogou uma garrafa, do tipo jogada ao mar no náufrago, com o papel dentro.
Continha palavras doces, penetrantes, complicadas e perfumadas.
Sonada e sem entender, corri. Desci desenfreada,
com a porta aberta o gato fugiu, e não consegui nada na ponta da escada

Desconcertante como alguém sabe tanto sobre ti
ou há palavras universais que valem para qualquer um sorrir
Devaneiei como bonita o homem na frente
Achei tolo, vazio e esquisito

No meio do dia me peguei perguntando ao porteiro do prédio, ao bar da esquina
sobre o homem fugidio, esforçando-me por lembrar...sei que tinha cabelos escuros
mais alto do que meu horizonte e.......só
Por muitos dias pensei em todas as possibilidades, sem conclusão

Em pensamento, cada vez mais escasso, do incidente confusão
No mercado do bairro encontrei velha amiga
Entre o café e o pão de queijo ela me contou a mesma armação
Ao invés de garrafa era uma caixa

Hipnotizada como eu, escondeu do marido e se encheu de erotismo
Também nunca chegara a suspeita concreta, apenas notou que o colega de trabalho a paquera
Reconfortante é saber que de coisa parecida todos têm
Precisamos uns dos outros para saber que somos alguém

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

sobre o dia em que nascemos

Embriaguez embaça a vista
Suportar o valor da minha classe média
Tradição burguesa, sustentar o status
fazer as vezes, sorrir, educar



Resta entorpecer, 
com aparatos criados por nós mesmos
O ópio social serve a todos
A alguns para disfarçar camuflar

outros, para dar o pão

Desde que o mundo o é
os escapes não escapam à condição
de gente, doída, imperfeita, foragida, cambaleante
Somos eu e você

Suspenda um pouco a mentira
para nos salvar da imposição
Mais nobre, mais burra e mais fácil

a arte, a religião e o ópio

A educação e a civilidade 

acham que nos imputaram muito bem
Todo domado tem um preço a pagar

Para a angústia quem nos ensinou?
Para a miséria quem nos tocou?
Para o desespero quem nos apartou?
Perco sono
Durmo sexo
Acordo fome

Como c(r)u Como cozido
Como frio Como quente
Como em pé Como sentido
Como bicho Como gente
Como duro Como mexido
Como com as mãos Como com os dentes
Como sado Como castigo
Como chuchu Como indiferente
Como só Como contigo
Como com boca Como de frente
Como devagar Como lascivo
Como você Como intensamente
Como forte Como exaurido

Se não tem fome sai da minha frente

É Como vício
Penso gorda apimentada
Saio toda engordurada
Febril e encarnada
De fome saciada
Com a cara deslavada
D’alma encapetada

fã-MINI-zine urbano

Augusta, sua puta, me fere
Consolação, meu bem, me afaga
Angélica, ingênua, se doa
Maria Antônia, de valor, corrompe a tradição

Entre a paulista e a Augusta
O Peixoto gomide
apertandinho, mas gomide
Tentando sua vez

Até concluir
Cidade, és mulher
Caótica, paradoxo,
Sedução
Não menos bela e necessária


Quem nunca se perdeu nas curvas da Bela Vista?