terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Porra, Humaniza essa Desgraça!

banda de garagem
filosofia de boteco
psicologia barata
poesia de quinta
meia foda

sou P.H.D. na porra toda.


sábado, 25 de dezembro de 2010

herança

talvez eu quisesse 
que vc me amasse
talvez eu quisesse 
que vc me queresse

talvez eu representasse 
apenas uma ancestralidade
de mulheres que queressem
que eu te quisesse

talvez eu parecesse
ao teu lado
apenas uma mulher
que alguém queresse

talvez eu não me importasse
sobre quem queresse
a mesma coisa
que eu quisesse 

talvez elas apenas quisessem
que alguém 
nesse mundo
se queresse

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

amor de pelô

eu pensava
que de tão escravizada
sinhô me escolheria
pra sua preta

eu nem pensava
que eram tão brancas
as tetas pretas

eu nem pensava
que no pelourinho
o tempo precisava
de tantos séculos
pra passar

eu pensava
que mais branca
era a carta
que enegreceria
minha alforria
ansio pelas lambidas
que já lamberam
meus pensamentos.
tão melados.

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

bebo, logo danço

bebo logo logo
bebo logo um lago
logo alago,
e alago bela

farinha de milho

uma casa deve ter
cheiro de bolo de forno

toda casa deve ter
feijão com louro no fogo
barulho de panela de pressão

a casa deve ter
aipim com manteiga à mesa
geléia framboesa

na sala deve haver vídeo game
no rádio deve tocar aquela do rei

deve ter vaso de manjericão
no quintal cocô do cão

deve ter a mim
precisa ter você

assim,
mesmo que não porte porta,
a gente pisa um chão

H2O

teu exagero,
gozo transpirado,
inunda todos os tacos
poros 
ladrilhos

após tal hecatombe 
hídrica
meu gozo escoa,
hidráulico,
ralo abaixo

- suspensa a visita do encanador -
há mulheres que respiram
uma meninice
bem no contorno dos lábios
uma sedução pueril

ainda que todos os filhos se escondam
nos pneus abdominais
nos seios fartos

os grisalhos fadam cansaços
de cuidados acumulados de muitas vidas
os olhos ora brilham lustrosos
ora brilham opacos

nas sacolas os ônibus todos
as patroas e os ladrões
de sonhos

no lábio, em seu contorno
na junção do nariz com a boca
ainda sensorialidade
de menina

peço licença ao passar por elas
com o maior respeito
pois tem que ser muito homem
para ter tanto peito

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

cheios e receios

ainda bem
anda bem cheio 
esse peito
 
depois de suas notas
notas surdas
salvas nas mudezas
de meu peito

peito meu
cheio e quieto
ganha cor e recheio
em palavras, revólveres e letreiros

e não há nada mais mundano
peito duro
bunda em cima.
ainda trepo sem precisar de escuro

(lerei só daqui uns trinta ânus)

vamos ver teu pau
o quanto dura

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

conto sem fada

nossa história
é uma anti-história de amor

tem princesas velhas
príncipes mancos
e cavalos nos barrancos

o aluguel do castelo vencido
os ratos fugidos dos porões

os amores antigos -
fantasmas

os fantasmas -
restos dos vivos

no reino tão do avesso
criado por nossas monarquias
o amor começa
quando tudo entre nós
já se acabou

mas um amor
que preenche
alguns cômodos
e acomoda
incômodos



domingo, 5 de dezembro de 2010

pelos pelos da perna

a lâmina nova
devora os velhos pelos
da canela, agora lisa

a única coisa que sei sobre você
é que gosta assim
(mesmo no inverno)

mas faço isso
para que não haja na conversa
uma só farpa de pelo

a escova de dentes,
agora solitária,
me pergunta para onde você foi

aproveita,
conta para ela

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

sorvete

gosto de gostar

de um gosto em que pensar
um gesto de lembrar
um cheiro pra devanear

gosto mesmo
de ter alguém
em quem pensar
alguém pra onde voltar

gosto de construir
por pedaço
esse troço

gosto de gostar
de um gosto
familiar

gosto de pensar
o quanto gosto
quando partes
ou quando ficas

bibir la bida

a piscina coberta do clube
faz uma pausa de parar o tempo
uma fenda
numa tarde quente

esportivos pouco velozes
dançavam nas suas águas
artificiais e limpas

a felicidade de som grave
apertava play no nat king cole

toucas, velhas e sungas
sorriam

era como se uma tela se abrisse
com um filme sueco qualquer

mas não

era a vida
acontecendo

sob meus olhos
sobre os meus narizes

o coração se enche de algum estranho
sei lá o quê

vivo

terça-feira, 30 de novembro de 2010

dezembro chove?

a noite cheira molhado
pela janela de dezembro

prédios desde nascença
- com raízes de bairro -
crescem retângulos furados
e espiam por seus furos olhos

luzes azuis
nas quadradas janelas
espelham corpos horizontais

tão logo amanhece
corpos verticais
correm atrás
de um Papai Noel em fuga

o que será que dormem?
como será que compram?
onde será que sobram?
quando será que doam?

terça-feira, 23 de novembro de 2010

oração ao são joão das bolas perdidas

mais poesia porra!
mais porra na poesia!
com prazer porra!
com porra porra!

gole

ritualisticamente
tomei o último café
assim que previ o fim

um gosto leve
de fruta viva
recém despencada

agora que acabou
veio vontade
pouca, é verdade

não há como comprar
o que se doa

doa o que houver
deste último gole do café
agora já frio

a pequena colher
- com o resto líquido -
descansa sobre a pia
sem pires

(as fases da alma
necessitam 
da concretude 
dos rituais)

não há o que fazer
fique onde está
a um passo
desabará pelo mar
formado de lodo

depois da insônia
não despertará
do que não se dorme

sonhos vigilantes
imagens remontadas
filmes conhecidos

passados que te pertenciam
histórias conhecidas
rostos familiares
cheiros regulares

agora é assim
desesperos atrozes
te descaminham
de onde nem sabe
para onde foi ou
para onde vai

domingo, 21 de novembro de 2010

oxi


misi fi

é muita mandinga trazê ocê pra mim


haja vela vermeia na encruzilhada

num presta enterrá santo antônio

terreiro diz que já não vale mais

caboclo afirma que já pegô catimbó


amor de um

quando não tem dois

não há galo, galinha, ou melaço

que desata todo esse nó!

domingo poesia

será que já é a hora de pseudônimo?
será que deixei de nascer de mim?

quando será que o poeta vem?
trabalha em feriado santo?

a palavra brota bruta?
a frase já vem riscada?

neruda escrevia sentado?
drummond batia à máquina?

escrever é do tipo que se aprende?
ou será talento que vem de fábrica?

será que não sou mais eu?
ou torno-me em minhas palavras?

em todo caso assino hoje como Clara.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

post

imagina só
guardo aqui
sem tirar o pó
um postal
escrito lá
para você
lá de longe
você noutra
eu na tua


nunca leu
nunca viu
nem sabe
nem eu sei
quando foi
que o amor
pelo mapa
se perdeu

um postal
sem endereço
sem leitor
colado agora
no mural
no avesso
só a cola

ninguém vê
teu texto
tuas lágrimas
só vêem
tuas terras
fotografadas
ao longe
numa Itália
poente e só.
prometo que vou estudar
depois dessa poesia mãe.

só mais uma tá?
amigos parindo livros
outros linguajando nenéns
outros com uma floresta de árvores

uns replantando a colheita

todo mundo regando, junto.

coisa bonita essa crescência

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Bamba

Sujei no samba meu novo sapato

agora com que cara vou pro trabalho?


Foi muvuca, vuco-vuco, esfrega-esfrega

umas branca

umas preta

uns bamba

Umas geladas, suor, empurra-empurra

uns pisões

uns amassões

uns chacoalha


Foi cantoria, foi roda de causo

tinha amigo, tinha hómi, tinha caso

Pandeiro, surdo,

cuíca e política

Sete corda, atabaque,

Agogô e amor


Ai ai ai quanta euforia.

Se sua sola dissesse,

meu pé nunca esquecia.


e o chefe nem se abatia.

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

Café e prosa

Há a fase do costume dos corpos.
As quenturas se dividem nas cobertas. Os cheiros se fundem - é você de cheiro de mim.
Os encaixes estabelecidos tornam os dias menos fúteis e os afazeres menos inúteis.
Fase dos olhos que enxergam antes o que a boca não vê durante a conversa.
Cala a língua de gosto insosso quando se dorme um sono de gosto comum.

Os objetos testemunham o balé de corpos que se conhecem mais do que a própria carne.
As falas ecoam os corredores pendurados de neologismos e dialetos de países de um habitante só.
As cadeiras acomodam as dores gastas para que as pernas bailem melhor.
Assim livres chinelem os pés da cozinha para a sala, da sala para o quarto, do quarto para o banheiro, do banho para a vida.

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

filhote de peixe

banhe-se num rio antigo
o quanto tiver que aguar.
nade nas águas
que não param de correr.
boie em suas ondas
enquanto tenha o que deixar levar.
visite suas margens
o quanto tiver o que florecer.
desemboque no mar
assim que o delta chegar.
rebata na água salobra
até quanto queira se livrar.
há uma vida de peixe
que não se pode abandonar.

terça-feira, 5 de outubro de 2010

boca do estômago

Não estou para papos nem opiniões
Estou para abraços, miados e arranhões
Não estou para chatos e bobalhões
Estou para bagunças e confusões

Não estou para fundo falso
Não estou para retrato
Não estou para miséria
Não estou para dieta

Estou para sonhos
Estou para amassos
Estou para poucos
Estou para engodos

Não estou para estar

(crescem proporcionalmente)

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

pelo poro

Conheço seu antebraço

mais do que você pensa

Acordo seus pelos

pelo sabor de uma vida

Inundo sua quarta-feira

pra parar de bobeira

Visto ao contrário a camisa

para ver de perto seus poros


Embalo os cheiros

Envergo as noites

Chovo a cidade


Só pra mostrar que sei

mesmo que só tenha ainda

o sabor do saberei.

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

pela pele

Sobre a pele, inventário de cicatrizes

Sobre o colo, constelação de pintas

Sobre as ancas, tilintar de quadris

Sob os pés, geografias psicológicas

Sob a cabeça, espremidos pensamentos

Sob a guela, abafadas lutas

Sob o peito, coração líquido

Sob as veias, rios de sonhos

Sobre o mundo, giros.
Sobre corpos, nascem.

domingo, 19 de setembro de 2010

guarda roupa

Engavetei tudo.
Etiquetei as letras
Dobrei os discos
Fracionei as blusas
Encabidei vestidos
Sacrifiquei calcinhas
Pendurei as ancas
Troquei as calças
Emaranhei as mangas
Tranquei colares
Misturei os brincos
Vesti as alças.

No armário, ao fundo,
o par de meias ainda me olha.
Não sei mais que verbo andar.

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

diz-me que tenho uma casa
cante-me a nova música
ponha-me no colo e sussurre
ria-me ao mostrar o giro do mundo
conte-me sobre o verão quente
leia-me um trecho inusitado
faz-me um sonho
faz-se junto

venha-me ao ventre
vem contente
aqui tem um monte de gente!


terça-feira, 7 de setembro de 2010

Vinis

No toca discos do papai reativo o primeiro disco de amor, os primeiros rocks juvenis e a coleção do antigo namorado.
Num domingo qualquer de pais e mães, em casas com tempos parados e ares de berço.
Os afetos aqui analógicos, se fixam. Retrocedem a tecnologia.
A cada passo pra frente sinto que posso ir mais e mais pra trás.
Esse é o dia em que a vitrola tocou e retocou as paredes das minhas reprises.
Enquanto permanecem na sala esses homens bases de minhas marquises.

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

habeas corpus

sou testemunha do que o corpo nos faz
sou cúmplice dos nossos nós
sou vítima de nossos próprios réus
sou acusação sempre que fala meu coração.
abro mão de minha defesa:
"meu corpo é testemunha do bem que me faz"

terça-feira, 31 de agosto de 2010

a generosidade é prima irmã do amor

o arco-íris quase termina em mim. na sua cidade também é assim?

carpinejar acalenta e alegra a alma. coisa de quem nasce verbo.

humildade é apenas reconhecer que o mundo é o umbigo.

la luna
luando
bem lá

fri lá, fri cá, e assim vai a vida free.

por carolina garrido

sexta-poesia

vejo os Homens como pequenos insetos
é seu mínimo que conduz meu olhar
prefiro
pessoas com piolhos
vermes
nuvens
uma comunidade dentro de um organismo

é o que desinteressa que me agrada

guenta

frequenta-me
e frequenta-me tudo

da cozinha
corte as cebolas
enquanto rego os gerânios
enquanto as famílias se arrebanham

da feira
aperte os tomates
enquanto encaminho as uvas
enquanto se infantam as crianças

do solo
encontre as raízes
enquanto rezo o húmus
enquanto se nutrem os pombos

freqüenta-me o bar
freqüenta-me a mesa

freqüenta-me o reino pulsante de pele

frequenta-me a tempo
a tempo de antes do vento

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

carpir, coser e letrar

lá na segunda-feira morava uma cidade

com barulhos cheios de avenidas
céus azuis cheios de sóis de inverno
nas faixas meninos de gel e terno

doutores que dissecam de(lírios)
mentes a quem nem podem enganar

galerias dentro de livros-poesia
de recheios de palavras a carpinejar

malas de aviões cumbicos
trens a energia lunar

costureiras de coser os dias
para ao fim ter a semana para entregar

lá no sábado a costura termina
quando tem um povo pronto para serhumanizar

não kai

na fórmula de três dois é melhor que seis
somos eu, você e nós, dando nó a três
duas vezes ceis são os nós menos três

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

papi

Pai, tu nunca vais,
por eu deixar-te ir.

Tenho sempre que lembrar-te,
de tanto amor que me sobra para dar.
Amores estes recheados de gestos do teu jeito de olhar.

Tenho sempre que lembrar-te,
da dureza que ensinaste de como as coisas são.
Hoje são as dores que de alguma maneira sei que não me matarão.

Tenho sempre que lembrar-te,
do mundo como tu me apresentaste.
Mundo de céus azuis, sonhos, bicicletas sem rodinha sobre a grama.

Tenho sempre que lembrar-te,
das etapas que tu comigo comemoraste.
Há escondida alguma certeza de que conseguirei, quase sempre.

Tenho sempre que lembrar-te,
cada casa
cada lágrima
cada saudade
cada lembrança
é um jeito de homenagear-te.

Sempre tenho que lembrar-te,
pois todos os dias no espelho
tu apareces refletido em mim.

domingo, 8 de agosto de 2010

poema provisório

Há no mundo domingos ensolarados e azuis
há parques com famílias e crianças
há restaurante e carne à mesa
há bochechas e sorrisos
há pais e há tios

Há no mundo apartamentos com vistas claras
há pôr-do-sol na janela
há jazz na sala de estar
há silêncio a ser ouvido

Há no mundo casas com corpos bem alimentados
há cabelos hidratados
há beijos amorosos
há colos quentes
há uma boa educação
há pro almoço macarrão

Há no mundo kitchinetes no centro
há esquina com botecos
há pivetes engraxates
há dívidas bancárias
há amigos escassos

Há no mundo janelas estreitas
há barulho de carros
há cenário de prédios
há bebida barata
há a mesma comida
há mãe indefinida

Há lugares com corpos que se cruzam
se afagam tão rápido
se doem nas pernas
se cruzam os braços
se abrem os sapatos

Há nesse mundo vai-e-vem
há de onde se vem
há pra onde se vai
há onde existe paz
há quando onde não se há

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

pingado e pão com manteiga
pro almoço uma massa caseira
faz-se em sampa uma terça-feira

há na praça um municipal fechado
sobre os meninos a aurora e o asfalto
sob um mesmo céu acinzentado

nas terras empilham-se os tijolos
e as moças limpam a poeira dos olhos
mas dos pães tiram os miolos

todo dia nasce ela na janela
de feiúra toda bela,
loira

morena
ou toda ruiva como ela

segunda-feira, 26 de julho de 2010

domingo, 25 de julho de 2010

ano do(ído)

Esse ano foi um ano pra lá de abusado,
se é que eu bem me tenho recordado.

Quase nada comprado,
tudo sempre apertado.
O que se teve foi muito usado,
pagando-se juro pra lá de aumentado.

Tudo o que passou foi suado
foi sofrido
foi chorado
e sorrido.

Todos que passaram foram jurados
amados
surrados
e idos.

Trabalhos bem feitos,
embora mal-pagos.
Tempos preciosos,
ora desperdiçados.

Sobra um safo,
com todos os anos passados,
ao fim do longo ano ido.

sexta-feira, 23 de julho de 2010

tudo que comove jorra
tudo que entristece seca
tudo que alegra também

tudo que indifere amarga
tudo que enfurece grita
tudo que vive também

tudo que se sonha permanece
tudo que se vai fica
tudo que se morre também

tudo que é nada
é parte da mesma.
coisa essa daqui de mim.

hai kai de quatro (linhas)

gosto do seu gosto
gosto do que gosta
goste ou não
gosto

segunda-feira, 19 de julho de 2010

se eu fosse um nome seria ana
se eu fosse um pronome seria santa
mas hoje sou eu comendo banana

domingo, 18 de julho de 2010

poetas escrevem sobre o poetar

psicanalistas falam sobre psicanalisar

eu me ponho apenas a me exalar
tudo que escrevo
transborda de amor
e seca de dor

as palavras me mantém
no nível no mar
pra que possa o rio continuar

tem domingo de manhã
que elas se põem a jorrar
depois de uma noite de muito sonhar

elas vêem e vem para me normotizar!
tem alguma poesia na ordem do dia
tem alguma valsa a espreitar nosso lar
ainda vivo tudo isso antes de me deitar!
depois da valsa de casimiro de abreu
meus ouvidos nunca mais pararam de musicar.
chacoalho agora as palavras no ritmo que elas quiserem entrar!

blasé

vá, vá quando quiser
fique também, caso queira
se ficar, que seja à vontade

use, use a xícara
dessa casa abuse
se quiser se lambuse

se não souber
faça o que quiser
nem ligue, nem tome, nem ame

se for faça certo
peça licensa, avise-me a tempo
de eu me haver com esse negócio que cresce aqui dentro.

quinta-feira, 15 de julho de 2010

abrobas

Tem a tranquilidade estranha de um feijão cozinhando,
tendo como certo o destino em ser grão na água que ferve.
O arroz resignado, entregue a toda sorte de ser o que se é.
As abóboras nunca se sabem doces ou salgadas.

A casa continente desse vapor quente, numa manhã um tanto diferente,
pouco entende sobre sua própria gente.
Dessas gentes que chegam para o almoço, mas se vão no jantar.

terça-feira, 13 de julho de 2010

Com você achei que havia apenas aquelas músicas para escutar,
quando para nós não havia mais baile para dançar.
Tínhamos somente uma história de sempre,
depois descrente, não vi mais semente.
O futuro se tornava hoje a cada manhã,
quando se escorria a esperança no amanhã.
Passava um domingo de chuva, um domingo de sol,
até que a semana se esturricasse no varal.
E se secasse a fronha.
E se fosse a mesa.
E se caísse a folha
de uma vida inteira.
Se eu montasse faria um filme
Se eu continuasse escreveria uma história
Se eu ritmasse faria um instrumento
Se eu me indignasse eu politicava
Se eu acreditasse eu pregava

Se eu tivesse outra vida
Escolheria essa própria
Só pra escolher o que sei,
E sei que amarei.

quinta-feira, 8 de julho de 2010

3 letras

Não me venha com essa cara tão limpa
com essa alegria amarela
com essa camisa singela

Não me olhe assim tão insípido
com essa córnea límpida
com esses dedos vívidos

Não me coma com tantos dentes
com essa tez tão contente
com essa fome premente

Não, aqui dentro não podes ver.

quarta-feira, 7 de julho de 2010

qual, qual é?

qual o problema em te espiar quando não me vês?

qual o problema em colecionar os seus tiques?
qual o problema em querer o sujo do seu all star?
qual o problema em me emaranhar nos teus filmes?
qual o problema em te esperar na sala de estar?

qual o problema em te desejar flores?
qual o problema em ainda te esconder as dores?
qual o problema em te dedicar todos os meus amores?

sem problemas, é só provar!

terça-feira, 29 de junho de 2010

simple heart

prefiro te olhar por centímetro
pensar com seu cheiro
ouvir teu sorriso

gosto de roubar alguns beijos
sugar teus segredos
respirar no teu ritmo

ando pronta a te lembrar
que já não posso esperar
o e(terno) de te encontrar

para de novo te olhar
de novo te:
novo-te

que tal:
eu vou-te,
tu venha-me!

domingo, 27 de junho de 2010

Há um coração a cada esquina,
que em cada batida arranca-me a luz do dia.
Por simplesmente ter um dia amado e deixado a dúvida.
A verdade que duvida que o amor se foi.

O que sobrou no meio dessas ruas?

Enquanto isso a manhã repassa as geografias percorridas,
em teimosia de uma lembrança secular.


Ensina-me a suportar, ensina-me a ensinar,
esse meu confuso coração a bater sem purular,
como se nunca mais pudesse saber o que é amar.

sexta-feira, 4 de junho de 2010

Anoitece

(versão final musicada por Tamis Parron )


um dia ainda te guardo no armário

um dia ainda te passo a fita

um dia engarrafo teu cheiro

um dia te enrosco na pia


um dia ainda te aqueço no espelho

um dia ainda te tranço as cadeiras

um dia a gente conta os cabelos

um dia a gente ainda se adia


ó, um dia, grandíssimo moço
você, um dia, com olhinhos de tolo
um dia você ainda me chama no escuro
um dia você me apela na noite
a noite que será de todo dia

domingo, 30 de maio de 2010

acontecia na noite - anoitecia

um dia ainda te guardo no armário
um dia ainda te passo a fita
um dia ainda engarrafo seu cheiro
um dia ainda te enrrosco na pia
um dia ainda te asso no forno
um dia te traço com margarina

um dia, grandissímo bom moço
um dia, você com olhinho de tolo
um dia você ainda me chama no escuro
um dia você me apela na noite
a noite que será todo dia

segunda-feira, 17 de maio de 2010

segunda-poesia


a lua andava pela rua
abdusida pela mansidão da noite escura,
trupicando em estrelas despencadas e
em nuvens moribundas esparramadas.
fumaças entre as curvas da esquina
revelaram (com o passar das horas) à primeira fita -
encarnecida, guardando a noite ainda em seus lilases -
o sol, no auge de ser métrico e círculo
quando então ouro e prata se puseram a caminhar
em forças opostas, sem nunca poderem se encontrar,
mesmo que sempre tentados pela tentação de se arruinarem
pelos seus brilhos adversários.

poesia de terça

com você quero
cama mesa e banho
com você quero
barba cabelo e bigode
com você quero
lavá enxugá e guardá

com você fico
com riso frouxo
perna bamba e
zóio troncho

a alma nua
a boca crua
a carne pura.

nada menos que três,
três beijos
três vidas
três dias sem ver a luz do dia

nós três:
eu
você
e nós, dando nó.

quarta-feira, 12 de maio de 2010

ocupação

queria ocupar-me de um fazer simples,
que me desse a vez de passar o dia,
sentindo brasas mínimas de alegrias

um fazer desresponsável,
que comesse o passar das horas
e trouxesse o ordenado na sua hora

remover as rosas mortas dos vasos do tempo
servir beleza aos rapazes dos cafés de paris
recolher as letras para dentro dos livros

soar o sino da catedral erguida sobre o ouro antigo de nossas minas

e assim esquecesse um pouco da minha alma roubada e cotidiana

terça-feira, 11 de maio de 2010

a lógica de ana, analógica

íamos menos ao analista quando escrevíamos cartas uns aos outros, longas cartas.

um manuscristo é um retratar-se sem rascunho.

não raro (se escritas com talento) as cartas
resultaram em belos livros de correspondências e biografias.

deixe a senha do email no testamento então...

quarta-feira, 5 de maio de 2010

lugarejar

sempre estive lá,
mesmo sem saber muito da natureza falar.

sempre estive nas palavras de todas as esquinas,
mesmo às vezes imersa na fumaça da rua.

sempre estive chatamente na hora marcada,
mesmo defasada pelas noites perdidas.

sempre estive envolta dos objetos vivos,
mesmo que encaixotada numa rotina.

sempre estive nessas letras que me escondem,
mesmo morando dentro de você.

estou sempre aqui onde estou, apesar de você.

domingo, 2 de maio de 2010

cor da tarde

A luz é amarela por simplemente anuciar-se só nesta tarde festeira.

Há o sino que assassina o silêncio e transforma os fluidos em cores suaves.

O livro aberto fala lá para dentro sobre os subúrbios embaixo de nós mesmos.

Por ser só, já matei minha fome de gente e permito que a noite escorra pelo poente.

Primeiro de maio

Abril foi um mês que ninguém viu - fechou as aspas.
Houve mentira em primeiro de abriu e quem não viu mentiu.

quinta-feira, 8 de abril de 2010

tulipa


As suburbanas tulipas
fazem tanto por trás de sua timidez.

Nós, cheios e urbanos,
nos espalhafatamos em vermelho e azul
- mas sem caule algum.

Seguras, elas nos olham com a compaixão
de quem vem ao mundo para mostrar
o que é ser dotado de beleza e sensatez.

quarta-feira, 31 de março de 2010

como pude pensar em algum dia deixar minha paixão se apaixonar?
como fui acreditar que com você era possível sem medo sonhar?
como me deixei encontrar em seus braços o fundo do teu olhar?
como lhe fiz o café mesmo sabendo que a manhã não podias adoçar?
como comer a vida sem saber a dor do gosto de experimentar?

conjuga-me

comeste toda uma constelação de palavras do idiomaterno (e engoliste a mãe também)

moram em ti, em cada prega,
em cada célula de banha,
a se acumular num corpo-envelope
- o próprio corpo cheio de letras,
histórias (sem pé nem cabeça, com começo/meio/fim, e sem fim)-
histórias tuas,
histórias alheias,
emprestadas, roubadas,
imprestáveis

elas se aglutinam, se unem,
se engancham umas às outras
gritam em forma de som,
vomitado pela porta-boca sem parar

meus ouvidos e penicos perdidos - já sem ouvir
ainda tentam acompanhar seus quilômetros discursivos funestos
(esses se fazem para que ninguém os ouça)

acabaste com as palavras do mundo
e as crianças não aprenderam a brincar de falar
- essas então devem ser as últimas palavras

eu prestes a descobrir sua palavra-chave
que cala a porta da tua loucura sem cura
e abre a janela da tua alma - talvez pouca e oca

segunda-feira, 29 de março de 2010

repouso

procuro o abraço que um dia tivera

aquele de deixar o corpo repousar, esmorecido
entregar o coração pranteado, no peito conhecido
deixar-se enterrar em braços de canduras e afagos
num envolto quente, de soprar na alma

aguardo aguda a volta de um futuro que ainda não tenho

domingo, 28 de março de 2010

costureira

se um poder me fosse facultado,
escolheria o de costurar o tempo:

câmera lenta
amarrar ponteiros
pular alguns dias
repetir outros
encurtar as horas
congelar momentos
acelerar outros mais
juntar pedaços do relógio
diminuir algumas esperas, mas só algumas
andar durante o outono, sem a estação mudar

só pra poder reviver, reaver, reparar, reatar
como se tivéssemos tempo de, como num rascunho, poder ensaiar

segunda-feira, 22 de março de 2010

Quem já sentiu a dor que rói o presente pelas beradas?
Aquela que prepara o futuro, esse que chega rasgando, sem uma palavra perguntar.

O passado agora, esgarçado pelo tempo, força a costura por onde a agulhar puder entrar,
seja no peito, seja de saia, seja calção, seja ao som samba-canção.

Essa duração líquida mostra onde eu não deveria estar, quando sem ter em que chão pisar me recolho em qualquer lugar.
Continuo, continuo sempre a pulsar...como um coração trôpego, acostumado a lutar.

quarta-feira, 17 de março de 2010

quero-quero


Dos poetas quero só as superfícies palavras

Dos humanos quero o pó do que toca a vida ao vivo


Quero me indignar com as não-palavras dos carnívoros humanos


De você quero o silêncio soturno das noites ensolaradas

Das tuas mãos, humildemente todos os dedos

Das tuas asas, todos os pássaros

De mim, paciência


Não quero palavras suas por não falar tua língua (apenas ainda não)


Quero, mas quero tudo o que sobra

Até onde vai o encontro de nossas próprias bordas.

ESTEIO

Venho senguindo as pegadas em forma de coração. E quando pego, me escapo, para outra e outra, e mais e mais para dentro do interior de algum país.
Os ossos a chacoalhar, como precussores do que as mãos têm a soar, atravessam o campo de mansidão.
Perdi a mão, que agora deve estar lá pelo lugar dos pés. Juntos, andam a esmo.

Quando pousar, te espero para arrumar a casa. Não sei por onde entra, nem por onde sai.
Onqotô aqui no meio? Toda cheia de carne e olhos, vejo a luz d'ouro sobre o centeio.
Faço um lamento baixinho, com cordas de aço e vozes de fado.
Contínua e ibérica, aqui mesmo na américa, sinto a mutação de grãos sem terra.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

sobre corpos, viveres e a invenção do tempo

No dia em que me casei, casei comigo e contigo.
Dancei todos os sonhos para dentro dos livros comuns.
Engarrafei as vontades que conheço e não conheço junto às uvas suas 
- essas que nunca envelheceram.

Vesti as melhores noites nas roupas desnudas das tuas bundas.
Ouvi os primeiros cabelos brancos enquanto a coberta dormia.
Li alto sem que você escutasse os contos que minha cabeça produzia.

As rugas cravavam nessa terra nosso caminho - agora banido.

O sapato vermelho ainda calça minha sede de viver, 
só que num mundo quadrado e vazio.

sábado, 13 de fevereiro de 2010

às vezes padeço de desistência. eu mal entendo.
são três da manhã. eu mal me lembro.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Ontogênese

Resido num denso invólucro visceral, 
com capacidade de mobilidade espacial, 
perenidade temporal e adaptação funcional.

Um ser bípede, mamífero, 
de gênero feminino, 
corporificado em formas e sensações visíveis e não visíveis. 

Imerso num mundo de símbolos aleatórios e caóticos 
que mediam, mas em nada remediam.

A vida mesmo é medida pela quantidade de arrepios, 
a evolução dos suspiros 
e o alcance dos sonhos.

(Esse versa a versão científica de mim).

sábado, 30 de janeiro de 2010

Idos vinhos


Aprendo com o acompanhar lento das taças a amontoar.
Essas mesmas que ouvidos hinos os vinhos vieram a soar.

A presença quente surge de repente e depois se faz carne.
Quando olho o olho sinto um cheiro de braço forte.

Enquanto os livros nos olham, saltam palavras de delicadeza.
Eu me esvaio em prosa pela mesa. Em pedaços e inteira.

Filogênese

Sobre os dentes as solidões se emplacam.
Multiplicam as multidões de bocas ocas.
As narinas, por assim terem nascido, têm uma a outra.
Os olhos ouvem, sempre que podem, juntos.
Um pé fincado na incongruência e outro na incerteza.
Bem vindo ao reino.
Humano.

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

se houvesse uma profissão seria estivadora da alma.
se houvesse um livro se chamaria inventário de cicatrizes.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Tenho certeza de que essa rua era um rio.
De que minha juventude transita rumo ao oceano.
De que minhas costelas grudam na calçada.
De que a inocência é um cavalo manco.
De que o fogo se apaga antes mesmo do vento.
De que a luz ilumina partes do que não se vê.
De que o encontro falseia com astúcia o que se quer minguar.
Mas a certeza de que a lua vem me olhar, me faz viva em qualquer lugar.

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

RADICAIS LIVRES

escutei tão bem o papai e mamãe diziam que hoje sei exatamente quando mentiam, quando tomo gosto pelo proibido.